Por Jorge Massarolo
Até tentei, mas não resisti. Todo ano tenho o hábito de escrever sobre o frio e desta vez tentei fugir do tema, mas não consegui. Além do frio que desembarcou na cidade nos últimos dias, os ingredientes estavam ali, espalhados pela casa, olhando para mim, junto com as lembranças da infância, e também não tão distantes assim. O agasalho, a laranja, o chimarrão, o machado, o guaipeca (cachorro) tremendo de frio, o céu nublado, as pessoas encasacadas nas ruas, nariz vermelho, a garoa típica do inverno.
Nasci e
passei metade da minha vida nos estados mais frios do País—Rio Grande do Sul e
Santa Catarina —, onde o rigor do frio cria hábitos e rotinas diferentes do
leve inverno campineiro. No entanto, no friorento domingo passado não deu
outra. Acordei com aquele céu nublado, frio, e não resisti a fazer um
chimarrão. Bom para esquentar o corpo e a alma. Saí de casa para ver se tinha
alguma brecha de sol no céu, mas nada.
Aproveitei
para arrumar os cobertores da minha guaipeca que estava com o pelo arrepiado e
tiritando de frio. Lembrei que na infância, escondido dos pais, abria a porta
da casa para colocar a minha perdigueira para dormir embaixo do fogão a lenha,
cujo calor permanecia até a madrugada.
Na garagem,
estava o machado deixado pelo amigo Leopoldo, usado dias antes para preparar a
lenha da fogueira de São João. Uma das minhas atividades favoritas para
espantar o frio matinal no Sul era rachar lenha.
Fogão a
lenha
Além de
reforçar o estoque do fogão, que ficava aceso praticamente 24h, era um
excelente exercício de aquecimento. O engraçado é que estive recentemente no
Sul e notei que o fogão a lenha está saindo das casas.
Um motivo é
o alto custo da lenha e o outro é que o pessoal está preferindo os aquecedores
elétricos. Uma pena. Mas mesmo assim foi possível ver, na madrugada, a fumaça
saindo da chaminé de algumas casas, dando sinal de que o dia estava prestes a
clarear.
Aliás, uma
das paisagens bonita que o frio proporciona é ver a lua refletida nos telhados
cobertos por gelo. Uma imagem surreal. Já vi geada em Campinas e foi comovente
ver a grama branquinha. Isso foi lá pela década de 90. Durou pouco, mas teve.
Tem gente
que não gosta do frio, OK, mas não adianta. Ele veio e é bom vir todos os anos.
É uma estação importantíssima para o equilíbrio da natureza. É só saber tirar
proveito. E aí entram as sopas, o vinho, o aconchego de um lar quentinho com a
família e amigos reunidos, um jantar, ouvir a chuva debaixo das cobertas,
enfim, um “dolce far niente”.
Por outro
lado, ele também leva à introspecção, ao acolhimento solidário e à doação.
Muita gente não tem estrutura para enfrentar esta estação do ano, e precisa de
sua ajuda.
Fonte: publicado no jornal Correio Popular em 2017
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