Não sou eu não na bicicleta, é o Mr. Bean
Confesso que nunca fui fanático por futebol, e, por consequência, nunca fui um bom jogador. Tinha forte presença como zagueiro e nada mais nada. Na infância e adolescência jogava pelo convívio social e pela falta de opção de lazer na minha pequena cidade, Barão de Cotegipe. Aliás, esse era um grande problema, ou jogava bola, ou jogava baralho.

Além de jogar as peladas de fim de tarde no “buraco da Cecília” (um campo aberto em meio a uma pequena elevação, onde seria construída a casa de Cecília), também joguei muito futebol de salão. Mas, queria um esporte que fosse além dos limites de um retângulo. Comecei então a praticar o que hoje chamam de bicicross. Montava na minha velha bicicleta, pneu linguiça, aro 28, presente do meu padrinho, e me largava pelas estradas de terra e pelo meio do mato. Nem capacete tinha. O vento na cara e a liberdade de poder ir a vários lugares tornaram a bicicleta minha paixão — que depois evolui para a motocicleta. 

Naquela época não existiam bikes especiais, com amortecedor etc e tal como as de hoje. O máximo era uma Calói ou Monark pneu balão (aro 26) ou pneu linguiça (aro 28). Também não existia essa parafernália toda para pedalar. Bastava ter força nas pernas e espírito de aventura.

E então surgiu um grupo de moleques com o mesmo desejo de aventuras. Nos domingos, equipados com ferramentas para pequenos consertos, um troquinho no bolso, caixa de fósforos e um canivete, saíamos cedinho para percorrer estradas de terra e picadas pelas colônias. Éramos uns 15 moleques.

Quando batia a fome pegávamos em plantações à beira da estrada o que a natureza nos oferecia. No Verão, assávamos milho verde e de sobremesa comíamos melancia ou melão. O rio mais próximo era sempre um convite para um banho. No Inverno, o prato era pinhão ou batata assada na grimpa, com direito a sobremesa de laranja ou bergamota. Daí a razão de levarmos o fósforo e a faquinha. 

Geralmente a viagem de ida era tranquila, uma contemplação e integração com a natureza. Já a volta era um verdadeiro “racha”. Andávamos quilômetros e quilômetros sem parar e ao máximo que podíamos. Cada um queria mostrar que era mais forte e veloz.

O máximo da aventura foi participar de uma romaria para a festa de Nossa Senhora da Salete, em Erechim. Equipamos duas bicicletas com farol alimentado por dínamo e nos largamos no cair da noite por uma estrada de terra de 12 quilômetros, basicamente de subida e muitas curvas. Tinha umas 25 bicicletas. Bonito de se ver. 

Chegamos à Igreja, rezamos e rapidinho pedalamos de volta, pois a emoção estava no retorno pela estrada escura. Era mais de meia-noite e aquele bando saiu em disparada pela estrada escura e cheia de curvas. No meio do caminho um dos dínamos quebrou, enquanto que a outra bicicleta equipada com o farol disparou na frente. Quem ficou no escuro tentava se guiar pela luz do luar. Depois de alguns tombos e trombadas em barrancos, nos encontramos na entrada da cidade exauridos e arranhados, mas felizes pela aventura bem-sucedida.

Bastava uma bicicleta velha, uma estrada de terra e o vento no rosto para sermos felizes.

Publicado no jornal Correio Popular, dia 28/07/2012

3 Comentários

  1. Ana Elise Ferri Capellari comentou seu link.

    "Jorge, muito bom. Foi lá que depois de muitos tombos e bicicletas roubadas dos primos que aprendi a pedalar. Esta semana estou no Rio, cidade maravilhosa que nos permite andar de bicicleta, e foi com ela que muito me diverti."

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  2. Altair Paz escreveu:
    "Estou com saudades daquele tempo,.... pedalamos muitooooo"

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  3. E os acampamentos que �amos de bike?
    Quando chovia tinhamos q parar para limpar o barro dos pneus.
    Que saudades, �timos tempos.
    Ab�

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